Metaforia Constante de Olhos que Ouvem Vida [ou resgatam o trauma da boca calada]

19.2.06

Boletim de Ocorrência

A declarante estava no Bar Bourbon Street, sito à rua dos Chanés, 127 e foi ao toalete. Os documentos estavam dentro de um plástico transparente em seu bolso. Eles caíram no chão sem que a declarante percebesse (ela sabe que foi nesse momento pois havia acabado de pagar sua conta). Saiu do toalete e em menos de 2 minutos percebeu a ausência do envelope contendo os documentos citados acima. Voltou imediatamente ao toalete e não o encontrou mais. A procura se deu mais 4 vezes. Os responsáveis pelo estabelecimento se comprometeram a ligar assim que soubessem de algo. A declarante informa ainda que permaneceu no local por mais aproximadamente uma hora na esperança de encontrar seus documentos. Por volta das 2h40 da madrugada voltou para casa afim de ligar para o banco e solicitar o cancelamento de seu cartão de débito e a sustação temporária de suas folhas de cheque.

A declarante informa ainda que apesar dos documentos, a noite não foi perdida. Foi contada e recontada para os amigos. Foi motivo de risadas e sorrisos. Então, seu oficial, assim que esses documentos forem encontrados, a declarante solicita que sejam chamadas as testemunhas e todos os elementos e meliantes e cambaleantes da cena do fato, para reconstituição do momento do crime. Um crime contra os princípios fundamentais de uma noite bem sucedida nos quesitos de aparência e futilidade numa balada comum paulistana.
Pois nada nesta noite foi comum, seu oficial.

A declarante encerra aqui o presente boletim de ocorrência.

12.2.06

Era como se estivesse num espaço novo.
De novo.

Ela já tinha passado por lá. Já conhecia os "esquemas".
E nem lembrava mais como era.
Sentia seus pés firmes em pontas estreitas de equilíbrio.

Sentia aquela música entrar em seus ouvidos.
Sentia corpos juntos ao seu.
Sentia algo diferente.

E aos poucos aquele equilíbrio todo ia arriscando.
Ia testando novos embalos.
Flutuava graciosamente. Ternamente. Etérea.

Embebedada. Ia perdendo o equilíbrio.
E já não flutuava mais.
Era segurada pelos corpos ao lado.
Era embalada por uma música intensa.
Continuava a dançar e sorria mais.
Estava feliz. E fazia outros felizes.
Sem se preocupar com o ritmo ou o difícil equilíbrio nas pontas estreitas.

Uma palhaça nas luzes da ribalta.
Sorrindo.
Dançando.
Linda, ridícula e suada,
beijando a noite.