Metaforia Constante de Olhos que Ouvem Vida [ou resgatam o trauma da boca calada]

23.6.06

Intervalo da espera


Amenidades. Período de transição que traz o conforto do falar do nada.

Dia desses fui tomar um pouco de chá. Dentre as novas resoluções da vida, resolvi que devo comer bem. E agora, tomo chá. E tinha chá novo e chá velho no armário. Eu nem lembrava. A ergonomia das portas dos armários não permitia um acesso visual claro e cotidiano. Peguei o chá novo. A água foi posta a ferver antes. No fogão, porque no microondas não tem a menor graça, e a panela nem suja mesmo. Quando coloquei o chá novo na água fervida, percebi que poderia fazer algo mais naquele que deveria ser o meu intervalo. Resolvi acabar com o que eu não via cotidianamente dentro daquele armário. Peguei o chá velho. Setembro de 2002. Realmente, nada de ergonômico o tal armário. Curiosa, resolvi descobrir se algo mais habitava a caixinha do chá que não só pó. E surpresa - ou não muito - descobri que todos os saquinhos estavam cheios de furinhos. Alguém tinha tomado chá seco. Eram dois bichinhos apenas. Carunchinhos de coisas secas. Dei tchau para os saquinhos furados, para a caixinha e os dois bichinhos e deixei-os no lixo seco. Talvez eles ainda tenham longa vida pela frente.

Talvez enfrentem juntos um infinidade de objetos secos para serem meticulosamente atravessados. Com a criação de túneis de passagem. Cidades feitas do pó.

E aí o chá acabou. O chá novo. O chá velho. E o intervalo da vida.

Retorno à espera.

E já já volto para falar de mais amenidades.

10.6.06

Raiva

Um sentimento que invade entranhas.

Calma.
Controlada. Naquela jaula dos sonhos.
Aquela jaula que contém o que não há de ser contido.

Eu não acredito que o lobo deva morrer de fome!

Eu alimentarei o lobo!

Continuo dando seu leite.
Dou-lhe minhas tetas embebidas,
e ele rasga minhas entranhas invadidas.
Faz evadir o meu sangue. Que pulsa, ainda.

Sairá sujo.
Da raiva contida.
O ódio que não traz em si a calma.
O torpor que não traz em si a paz.
O choro que soluçando, não soluciona.

Não há mal que sempre dure.
Não há bem que nunca acabe.

A força grita. O controle permite.
Os dedos não acompanham.
O corpo quer gritar.
E voar.
Saltar. E morrer.

Livre!

E só.

Só.

Só.



O lobo sairá;
Verá a luz;
Verá o sol;
E o cachorro amor de todos.

E os dois serão um.
Embebidos do sangue e do leite.
De ambos.